O teu telefonema salpicou os meus pensamentos desta manhã quieta. Querias avisar-me que ia chover intensamente. Tinha de limpar o terraço das muitas folhas que os bambus acumulam e que acabam por entupir o ralo de escoamento. De pés descalços e apenas o impermeável por cima da pele quente saída da cama aventurei-me nesta tarefa. O teu casaco grande e protector não evitava que as pingas escorressem pelo rosto e descessem pelo pescoço. Fez-me lembrar os doces passeios deste fim-de-semana à chuva. Dos pingos teimosos que não paravam de cair, com tão grande teimosia quanto a nossa de insistir no passeio. Abraçados, em passos largos e lentos ao sabor do puro improviso.
Há dias de chuva diferentes dos outros.
Dias de chuva morna, quente, melancólica. Ouvi num filme que o amor era como o tempo: os dias de chuva também fazem parte do bom tempo. Gosto muito desta expressão. É bonita. Porque há dias de chuva em que nos enroscamos como dois velhinhos em cobertores. Há dias de chuva em que vamos ao cinema. Há dias de chuva em que andamos às compras em Madrid. Há dias de chuva em que pernoitamos com amigos tagarelando até amanhecer. Há dias de chuva em que olhamos pela janela em contemplação. Há dias de chuva em que viajamos e enquanto um conduz o outro dorme seguro de acordar noutro ponto da viagem. Há dias de chuva em que o chão cheira a terra e a gente e a tudo o que há de vivo e de belo. Há dias de chuva que deviam ser canções, filmes, fotografias, cheiros, perfumes... para podermos guardar e reviver em qualquer altura do ano. Há dias de chuva que são diferentes, são como salpicos doces do nosso perfume preferido.
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