We are going to the moon, that is not very far.
Man has so much farther to go within himself.
Anais Nin


I
Ainda não partiste e já o meu estado de espírito se muda, o corpo se muda, os dias se mudam.
Começa a abrir-se um espaço largo como pontes sobre o nada, a fímbria ínfima dos dias, o ser Atlas e ser gente. Tem sido uma constante permanente nos anos que se arrastam as amarras soltas, laças, o amor a medo, o escuro, o adivinhar.
Havia um tempo de medo, antes, muito antes de hoje, um tempo de cólera que seivava o amor e as palavras, um tempo de desolação e fragilidade onde o corpo se quebrava como gelo fino.
A luta por sobreviver faz-nos mal, torna-nos animais e desesperados, cães famintos a revirar o lixo à procura de carne e afectos.
Era um tempo onde o escuro era grande como um espelho onde todos os monstros se tornavam visíveis e insuportáveis.
Depois fugi.
Depois veio na mala tudo o que era e a pele também.
Depois vi-te ou foste tu que me viste, mais provável uma vez que o meu olhar andava sempre nas nuvens ou no chão e raramente ao nível de outros olhos.
Depois fomos um.
Depois fomos dois e o machado ampotou-nos o coração, o amor e os gestos.
Tornamo-nos mais duros e menos crentes, mais indolentes.
Depois aprendi outra vez todas as linhas do teu corpo, os limites da nossa força, o silêncio e a palavras.
Agora parte outra vez e muitas horas hão-de vir depois desta. Já sem o fervor da paixão e as lágrimas da juventude. Apenas um rio de água delgado como a dor que me ensopa o peito, debaixo da roupa. Apenas o corpo magro como um barco sem cais sovado da tempestade.


II
Amo os teus olhos castanhos como as luas, as giestas e as tardes de verão,
não sei se é a gente que se muda, se a minha linguagem já não é deste tempo.
Antes escrevia, agora nem isso, vou acumulando nos bolsos, no peito, nos olhos o peso das coisas nunca ditas até pesarem tanto que me sinto um insecto arrastando um rochedo.
Amo as ruas e as pétalas e o teu corpo a cheira a urze e a pradaria.
Se pudesse mentir, acredita que mentia,
só para que não nos dissessem que não somos daqui.
Há tempos que não via os teus olhos por trás do azul do céu
e da beleza pálida e perfeita do teu rosto.
Hoje pareceram-me mais perfeitos e doces que sempre,
pareciam de mel e infância.
Amanhã se me vires abraça-me só para saber que és real
e que os teus braços são quentes e me sustentam em segredo
nos bosques onde fadas e elfos dão festas onde o Amor se senta em
orquídeas lilazes e aveludadas. Sem pudor nem armas.

1 comentários:

Anonymous said...

Minha querida,

Se a minha história se quisesse dizer ou, finalmente, deixar-se ler por olhos estranhos, encontraria nestas tuas palavras uma surpreendente imagem de si mesma.
É, por vezes, quando nos convencemos do nosso isolamento ou insistimos na solidão de um caminho apenas por nós trilhado que, inesperadamente, percebemos no outro um mesmo olhar ou uma familiar força escondida – imperturbável.
Se as penas do teu caminho te fizeram assim tão especial…
Então que eu também me sinta sempre muito especial.

Deirde

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