Lembro-me quase todos os dias de ti. Das tuas mãos, das tuas esferas, da tua pele de marfim e narcisos. Houve um tempo em que ter-te era apenas esperar os teus passos na escada matálica, no corredor, no hall de entrada. Agora estás à distância duma auto-estrada inteira, mas isso é pouco para desafiar o tamanho do meu abraço, do meu desejo de te erguer no ar como se tivesses 3 anos e fosses muito pequenina. Recordo todos os personagens que inventámos juntas, porque eu sou um cata-vento e movimento-me ao sabor da brisa e dos vendavais e apenas tu, consegues mudar a direcção do vento e transformar em vento morno as frias nortadas que por vezes me vergam. A tua tinta escorre cá dentro, eu também bebo tinta com sangue e com chá, criar é ter os sentidos todos dispertos na direcção do mundo. Às vezes cumprimos, às vezes quebramos as regras, em frente a uma paleta saborosa como uma fatia de tarte de maçã fumegante resumimos os dias anteriores, contamos a manhã de hoje, saltamos para o passado, fazemos cinema e voltamos a dar as mãos. Podíamos de novo dançar, como dantes, queres? Ondulantes na noite, aos rodopios pela relva verde. A minha cabeça no teu colo, num banco de jardim. A beleza que te empresto não é minha, é tua. Tenho vontade de dançar descalça com o volume no máximo como te vejo fazer, de me atirar para cima do sofá e sentir as almofadas, o chão fresco, as horas e horas longe de tudo, envolvida no perfume acre da tinta a imaginar de olhos abertos como se fossem quadros, o que vais pintar em mim hoje.
0 comentários:
Post a Comment