Filhos das trevas

Friday, March 28, 2008 | 1 Comments



Os filhos das trevas acordam com a noite os instintos dos lobos e das sombras nas vielas, são gente de olhos cavos, profundos, perdidos no vaguear dos transeuntes que acompanham como cães famintos à espera de um osso, os filhos das trevas adormecem no carro de cansaço sem caminho para casa, sem casa, sem gente à espera, adormecem a ver a luz dos faróis cruzar a avenida a toda a velocidade, os candeeiros trémulos, a luz difusa e só. Os filhos das trevas têm fome de amor, de toque, de fervor, de adormecer numa cama quente, aquecida por outro corpo que não o seu. Os filhos da noite por vezes choram de desespero e solidão numa velhice improfessável, e queriam ser o casal que atravessa a rua enroscado um no outro para escapar ao frio, queriam ser a árvore que valsa na noite. Queriam, poder não sentir a dor lancinante que lhes corta a voz num trago, queriam não sentir o vidro frio da garrafa empapar-se nos dedos. Os filhos das trevas queriam não ter o coração a meio, adiado, decepado pela espera, pela contentação, pela dissimulação do amor.

1 comentários:

Deirdre said...

Felizmente, para nós que às vezes caímos nas trevas, existem seres alados e cheios de luz que nos resgatam da escuridão.
Como tu, Mei.

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Mei and Arawn