Uma prenda e duas mão vazias...

Friday, September 29, 2006 | 0 Comments

A minha irmã não faz anos hoje, mas isso nao é menos razão para a compensar de uma hora de almoço na loja do cidadão a resolver chatices com uma prenda.
Não falo de algo que surja de uma investida pelas lojas, de imaginação em punho na busca do equilíbrio com a outra mão, onde segue leve a carteira. Não. Uma prenda assim é pouco, demasiado pouco para que possa ficar satisfeita, porventura tão pouco que nem necessária é. Uma prenda qualquer pessoa pode dar, na volta até dão o mesmo que eu, ou melhor ainda, depende da carteira que nem sempre é do tamanho do nosso coração. Quase nunca.
O dia está de chuva, estes dias também são bons, eu gosto. Há qualquer que me agrada, talvez a melancolia da água a bater nos vidros, ou a incomodidade de um chapéu para quando chove a direito, ou apenas a voz dela ao meu lado a apontar o reflexo prateado da luz tímida no rio quedo.
Ela é uma personagem incontornável da minha vida. O que não sabe de mim? Não faço ideia, desconfio que sabe mais de mim do que eu própria. Horas e horas a aturar-me, não é fácil, horas e horas a ouvir-me, sobre tudo, mas principalmente, sobre nada. Não era a mesma sem ela, nem este blog não seria o mesmo sem ela, quanto mais eu. Quando acontece qualquer coisa importante, está ali, quando acontece qualquer coisa sem importância nenhuma está ali na mesma, nos bons e nos maus momentos, a chorar, a rir, a ralhar comigo, e é tão giro! :) Mas não se iludam, ela não é a melhor amiga do mundo nem é perfeita e nisso estamos perfeitamente bem uma para a outra. Desejamos aperfeiçoarmo-nos, mas não nos vemos perfeitas. Sobretudo é uma à outra que vemos no espelho e não apenas a projecção dos nossos desejos e do que queríamos que a outra fosse. A nossa união cerrada não foi resultado de nenhuma contrariedade ou nenhum momento extraordinariamente difícil e deprimente ou efusivo e vitorioso, não. Pois claro que já os vivemos e não foram poucos, mas dissolvidos noutra coisa extraordinária que é a rotina de todos os dias, o ram-ram, o búlico do tédio. A nossa amizade vem de não termos deixado de ter coisas para dizer ou aprender.
Já morei no quarto ao lado do dela e batia na parede quando precisava dela e sei que apesar dos nós nos meus dedos na parede forrada a papel não fazerem qualquer barulho que elas os ouvia sempre, porque a verdade é que vinha sempre ter comigo. A minha irmã é das pessoas mais curiosas que eu conheço, não suporta que lhe escondamos o sorriso que mora do lado de dentro dos lábios, nem as conversas ocas tecidas de lugares comuns. A minha irmã tem defeitos às carradas, tal como eu. A minha irmã lê tudo o que eu escrevo. A minha irmã fica rabugenta quando está cansada. A minha irmã irrita-me quando eu lhe pergunto o caminho e ela responde com ar trocista de quem nunca se perde. A minha irmã faz-me corar de vergonha quando falo dos defeitos dos outros e me diz que eu já fiz o mesmo. A minha irmã nunca me falhou quando eu precisei dela. A minha irmã adora atúuuuuuuuuuuum. A minha irmã faz-me sentir uma princesa das histórias de encantar que nunca lemos em pequenas quando me deixa usar as roupas e sapatos dela. A minha irmã nunca me inventou desculpas, só me inventou desenhos para eu limpar a tristeza da cara.
Hoje é o dia do seu não aniversário, às vezes tenho postais para estes dias, outras flores, outras yogutes acabadinhos de fazer, hoje não tenho nada disso e foi de propósito. Ela é demasiado importante para que uma simples prenda possa fazer a diferença. Fiz um texto. Porque mais ninguém sabe o que eu sei, mais ninguém vive paredes-meias com ela. Eu sei que há muita gente que tem o mesmo privilégio que eu tenho, mas também sei que as pessoas às vezes são distraídas e, como nós, imperfeitas, e se esquecem, vá se lá saber como, deve ser do queijinho é uma coisa muito boa que nos branqueia a memória tipo efeito neoblanc nos lençois, por isso convém ir lembrando. Por tudo isto, por mais um dia de não aniversário que é, como já se viu, uma desculpa como outra qualquer para nunca esquecer de amar.

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